segunda-feira, 16 de junho de 2014

Cientistas britânicos prometem tratamento dentário sem brocas


Atualizado em  16 de junho, 2014 - 14:56 (Brasília) 17:56 GMT
Nova tecnologia poderá significar o fim das assustadoras brocas
Pesquisadores britânicos acreditam ter encontrado uma maneira de fazer tratamentos dentários sem a necessidade da broca.
Os cientistas da universidade King's College London acreditam que eletricidade pode ser usada para fortalecer um dente ao forçar minerais para dentro da camada do esmalte dentário.
Assim, eles esperam que a técnica acabe não só com a necessidade de brocas, mas também de injeções e obturações.
Mineirais como o cálcio e fosfato circulam naturalmente para dentro e fora do dente. O ácido produzido pelas bactérias que processam o alimento na boca ajuda os dentes a perder esses minerais.
Na experiência, o grupo de pesquisadores aplicou um coquetel de mineirais e depois usou uma fraca corrente elétrica para direcionar os minerais para dentro do dente.
Eles dizem que, assim, o processo, chamado de Electrically Accelerated and Enhanced Remineralisation("remineralização Eletricamente Acelerada e Aumentada", em tradução livre), reforça o dente.
Cárie dentária antes do tratamento
Cárie dentária após o tratamento

Estágio inicial

A empresa Reminova, baseada em Perth, na Escócia, foi criada para tornar a técnica disponível para dentistas nos próximos três anos.
Não há dispositivo para ser visto, e devido à confidencialidade, não houve nenhuma evidência publicada sobre a eficácia da técnica em publicações médicas.
Nigel Pitts, um dos inventores, e um investidor na nova empresa, disse à BBC: "O estágio ainda é inicial, você não começa com o produto final, mas estamos animados porque acreditamos que a técnica seja inovadora."
"Nós criamos uma empresa para transformar uma tecnologia de demonstração em um produto comercial viável que podemos colocar nas mãos de dentistas por todo o mundo."
Ele disse que a tecnologia tem o potencial de substituir a necessidade de várias obturações, mas que não pode atacar cáries em "estágio final".
"O que a técnica não vai fazer é dentes voltar a crescer fisicamente", ele disse.



Fonte https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=7955764524784020829#editor/target=post;postID=6455606332796008548

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Descoberta pode levar a pílula 'antiapetite' contra obesidade

Atualizado em  1 de maio, 2014 - 15:11 (Brasília) 18:11 GMT

Mulher obesa | Crédito: PA
Remédio poderia combater obesidade, hoje uma epidemia global, dizem pesquisadores
A descoberta de uma molécula que diz ao corpo quando se deve parar de comer abre caminho para o desenvolvimento de novos medicamentos contra a obesidade, anunciaram cientistas na Grã-Bretanha.
Segundo pesquisadores do Imperial College, de Londres, o segredo estaria em uma substância chamada acetato, liberada no intestino durante a digestão das fibras presentes em frutas, legumes e verduras.
Eles dizem que uma pílula com a molécula teoricamente poderia ajudar as pessoas a diminuírem a ingestão de comida sem se submeter a dietas rigorosas.
No Brasil, ainda que a obesidade tenha parado de crescer, segundo pesquisa divulgada na quarta-feira, 50,8% têm sobrepeso – e 17,5% são obesos.
O estudo britânico, que foi publicado na revista científicaNature, aponta que grandes quantidades de acetato são liberadas quando frutas, legumes e verduras são digeridas por bactérias intestinais.

Hipotálamo

Os cientistas observaram o comportamento da molécula e constataram que a substância tinha impacto sobre a região do hipotálamo do cérebro, que controla a fome.
A pesquisa sugere que a obesidade se tornou uma epidemia global quando a humanidade passou a ter uma dieta baseada em comida processada, que não reage com a bactéria presente no intestino e, portanto, não produz acetato. Dessa forma, o cérebro não recebe qualquer sinal de saciedade.
Atualmente, a dieta padrão na Europa contém apenas 15 gramas de fibras por dia. Nos tempos da Idade da Pedra, esse valor era de 100 gramas por dia.
"Infelizmente, o nosso sistema digestivo não evoluiu a tal ponto de termos de lidar com a dieta moderna e esse desequilíbrio contribui para a epidemia de obesidade de hoje em dia", afirmou o professor Gary Frost, do Imperial College, ao jornal britânico The Daily Telegraph.

Novas drogas

Embora afirmem que a principal conclusão da pesquisa é alertar sobre a necessidade de ingerir mais frutas, verduras e legumes, os cientistas dizem acreditar que seria possível criar novas drogas para ajudar quem faz dieta.
"Nossa pesquisa mostra que a liberação do acetato é importante para entender como as fibras reduzem o apetite e isso pode ajudar a comunidade médica a combater a ingestão excessiva de alimentos", afirmou Frost.

Raio-X da obesidade no Brasil

  • 50,8% dos brasileiros estão acima do peso ideal – destes, 17,5% são obesos
  • Proporção de homens e mulheres obesos: 17,5%
  • Proporção de homens com sobrepeso: 54,7%
  • Proporção de mulheres com sobrepeso: 47,4%
  • 16,5% dos brasileiros substituem substituem o almoço ou o jantar por um lanche de baixo valor nutritivo, como uma pizza ou um sanduíche
  • 31% dos brasileiros não dispensam a carne gordurosa e mais da metade (53,3%) consome leite integral (o tipo mais gorduroso) regularmente
Fonte: Vigitel/Ministério da Saúde
"O maior desafio é desenvolver uma droga que possa liberar a quantidade de acetato necessária para controlar a saciedade de uma forma que seja aceitável e segura para os humanos", acrescentou o pesquisador.

Pesquisa

O estudo analisou os efeitos de um tipo de fibra chamada inulina, que vem da chicória e beterraba e também é adicionada em barras de cereais.
Experimentos feitos em camundongos revelaram que as cobaias submetidas a uma dieta rica em gordura com adição de inulina comeram menos e ganharam menos peso do que as que ingeriram uma dieta rica em gordura sem inulina.
Eles também descobriram que o acetato se acumula no hipotálamo e ali desencadeia uma série de reações químicas que afetam neurônios, reduzindo fome.
A pesquisa também mostrou que quando o acetato foi injetado diretamente na corrente sanguínea, no intestino ou no cérebro, os camundongos reduziram a ingestão de comida.
Como o acetato permanece ativo apenas por um pequeno período de tempo no corpo, cientistas acreditam que uma "pílula de acetato" seja necessária para prolongar o efeito da substância no organismo.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Sangue artificial deve começar a ser testado em humanos até 2016

Atualizado em  16 de abril, 2014 - 17:30 (Brasília) 20:30 GMT

Banco de sangue | Crédito: BBC
Consórcio de universidades e órgãos do governo britânico está por trás de iniciativa, que poderá elevar estoque para transfusões
Cientistas britânicos querem começar a testar sangue artificial pela primeira vez em humanos nos próximos três anos.
Eles planejam iniciar a primeira fase de testes com voluntários no final de 2016 ou no início de 2017.
Por trás da iniciativa está um consórcio de universidades e órgãos do governo do Reino Unido que já vem produzindo células sanguíneas a partir de células-tronco.
As células-tronco são aquelas capazes de se transformar em qualquer outra célula do corpo humano. Muitos estudiosos apostam nelas como a chave para a cura de inúmeras doenças.
Cultivadas em laboratório, as células sanguíneas poderiam ser, assim, usadas para transfusões, evitando uma série de problemas comumente observados nesse processo, como o risco de transmissão de infecções, a incompatibilidade com o sistema imunológico do receptor e a possibilidade de excesso de ferro no sangue do doador.
Além disso, se for bem sucedido, o projeto permitirá aumentar a oferta de sangue disponível para transfusões.
Muitos países do mundo, como o Brasil, sofrem com o estoque dos bancos de sangue, que, alimentados por doações públicas, são insuficientes para atender a crescente demanda pelo material.
Segundo os envolvidos na pesquisa, o uso de células sanguíneas cultivadas em laboratório também apresentaria uma vantagem clínica em relação ao sangue colhido de doadores.
Isso porque, de acordo com os cientistas, as células produzidas artificialmente são mais novas e têm maior longevidade.
"Produzir uma terapia celular que leve em conta a escala, a qualidade e a segurança exigidas para testes clínicos em humanos é um desafio muito grande. Mas se tivermos êxito, poderemos garantir a populações de diferentes países o benefício dessas transfusões de sangue", afirmou Marc Turner, professor da Universidade de Edimburgo, na Escócia, e responsável pelo projeto.
"Os testes que faremos também fornecerão informação de valor a outros pesquisadores no desenvolvimento de terapias celulares", acrescentou.

Técnica

Turner e sua equipe usaram uma técnica que cria células do sangue a partir de células-tronco pluripotentes induzidas, também conhecidas como células iPS ou iPSCs.
Por esse artíficio, as células doadoras são isoladas e cultivadas. Posteriormente, transferem-se para elas os genes das células-tronco associadas por meio de vetores virais.
Ao final do processo, as células-tronco pluripotentes induzidas são estimuladas por uma substância química para se transformar em células do sangue do tipo O, raro e universal.
Segundo Turner, é provável que os testes sejam feitos em três pacientes com talassemia, uma doença que acomete o sangue e exige transfusões contínuas.
O comportamento das células sanguíneas produzidas artificialmente será monitorado durante os testes, acrescentou o pesquisador.
Ele, no entanto, ressalva que ainda há um longo caminho a percorrer para produzir sangue artificial em escala "industrial".
Atualmente, o custo para uma única transfusão de sangue é de 120 libras no Reino Unido, ou R$ 360.
Para Turner, se os testes forem eficazes, esses custos poderão ser reduzidos substancialmente no futuro.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Novas diretrizes tentam reduzir número de cesáreas nos EUA


Mulher indo para cesárea (BBC)
Cirurgia é usada em um a cada três partos nos Estados Unidos; Índice alto preocupa especialistas
A preocupação com a alta taxa de cesarianas nos Estados Unidos levou à publicação recente de novas diretrizes sobre o tema por duas das principais sociedades médicas do país.
Atualmente, um em cada três partos realizados nos Estados Unidos é feito por meio da cirurgia e essa taxa vem aumentando desde 1996.
Por isso, em fevereiro deste ano, o American College of Obstetricians and Gynecologists (Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia, ou ACOG, na sigla em inglês) e a Society for Maternal-Fetal Medicine (Sociedade de Medicina Materno-Fetal, ou SMFM) divulgaram em conjunto uma série de novas recomendações.
Os órgãos pediram aos médicos para esperar mais pelo nascimento do bebê durante o parto normal e para que eles tentem outras alternativas para ajudar no parto antes de recorrer à cesárea.
"Muitas mulheres podem simplesmente precisar de um pouco mais de tempo em trabalho de parto para dar à luz de maneira natural", diz Aaron Caughey, membro do comitê responsável pelas novas diretrizes.

Recomendações

Entre as recomendações estão a de que os médicos usem pressão externa para tentar reposicionar o bebê quando este não estiver de cabeça para baixo, em vez de recorrer imediatamente à cesárea.
O documento também afirma que médicos não devem optar pela cesariana automaticamente em casos em que o bebê for muito grande.
Segundo as diretrizes, é preciso permitir que a mulher faça força para empurrar o bebê por pelo menos duas horas, se já tiver dado à luz anteriormente, ou três horas, se for seu primeiro parto.
Em determinados casos, como quando há anestesia peridural, esse tempo pode ser ainda maior.
Outra recomendação é recorrer a técnicas que auxiliem na realização do parto normal, inclusive o uso de fórceps.

Crescimento

As recomendações são dirigidas principalmente a mulheres que vão dar à luz pela primeira vez.
Segundo Caughey, a maioria das mulheres que têm o primeiro filho por meio de cesariana acaba repetindo o procedimento nos partos seguintes.
"É isso que estamos tentando evitar", afirma o médico.
Em 1996, a taxa de cesariana nos EUA era de 20,7%. Nos 13 anos seguintes, deu um salto de 60%, chegando a 32,9% em 2009 e permanecendo nesse patamar desde então.
Os números variam de Estado para Estado. O Kentucky tem a taxa mais alta, de quase 40% dos partos, enquanto a do Alasca é de 22,6%.

Salvar vidas

No documento, as entidades reconhecem que a cesariana pode salvar vidas, tanto do bebê quanto da mãe.
"No entanto, o rápido aumento nas taxas de cesariana de 1996 a 2011, sem clara evidência de redução concomitante em mortalidade materna ou neonatal, levanta expressiva preocupação de que a cesariana esteja sendo usada em demasia", diz o texto.
Segundo o documento, a taxa de mortalidade entre mulheres submetidas a cesariana é de 13 mortes em cada 100 mil mulheres, mais de três vezes maior do que em partos normais.
O presidente da SMFM, Vincenzo Berghella, reconhece que em alguns casos a cesariana é realmente a melhor opção.
No entanto, o médico diz que, na maioria dos casos, em que a gravidez é de baixo risco, "a cesariana pode representar um risco maior do que o parto normal", especialmente em relação a futuras gestações.
Fonte Alessandra Corrêa
Atualizado em  14 de abril, 2014 - 13:14 (Brasília) 16:14 GMT

Tradição de parteiras está no centro de incentivo ao parto normal na Grã-Bretanha


O principal profissional responsável pelo acompanhamento da gestante britânica é a parteira
Até 2011,o índice de cesarianas realizadas no Reino Unido era de 25% do total de partos. Era possível argumentar que isso ocorria não por uma preferência das mulheres britânicas por partos normais, mas porque não era dada a elas o direito de fazer uma cesariana planejada e por opção própria. Elas só podiam passar pelo procedimento se houvesse razões médicas.
Mas, a partir daquele ano, a regra mudou.
Gestantes passaram a ter direito de escolher a cesárea, segundo novas diretrizes do Instituto Nacional de Saúde e Excelência Clínica (NICE, na sigla em inglês).
O que não mudou deste então foi a taxa de cesáreas, que permaneceu no mesmo patamar.
Segundo os dados mais recentes do Health and Social Care Information Centre, órgão do governo britânico que compila informações de saúde pública, 25,5% dos partos registrados entre 2012 e 2013 foram cesáreas.
Hoje, as mulheres são informadas dos riscos da cirurgia por um médico, mas, se ela optar pela cesárea, isso não pode ser negado. Ainda assim, houve um aumento de só 0,5 ponto percentual no índice.
Essas estatísticas refletem a política de saúde pública do país, que prioriza o parto normal. Para o NHS, o Serviço Nacional de Saúde britânico, o parto planejado por cesariana é um recurso que só deve ser utilizado em condições excepcionais.

A longa tradição das parteiras

Parte deste esforço de dar prioridade ao parto normal se deve ao forte histórico da profissão de parteira no país, estabelecida em lei pelo Ato Midwifery, em 1902.
A primeira e única vez que uma gestante britânica é avaliada por um médico é ao descobrir que está grávida, quando normalmente procura um clínico geral, conhecido como general practitioner no país.
Mas a parteira é o principal profissional responsável pela saúde, segurança e bem estar da mulher durante a gestação e cuida do atendimento pré e pós natal.
Qualquer pessoa pode ingressar na profissão após um curso profissionalizante em tempo integral de no mínimo 156 semanas, segundo critérios estabelecidos pela União Européia.
Outra maneira é através de um curso mais curto, de 78 semanas, voltado para enfermeiras e enfermeiros que queiram seguir uma nova profissão.

Em casa ou no hospital?

Quando não há riscos para a mãe ou para o bebê, o NHS indica o parto normal e oferece algumas opções para a hora de dar à luz.
Além do hospital, é possível parir em casa com a ajuda das parteiras ou em clínicas conhecidas como centros de nascimento, que têm um ambiente mais caseiro que o dos hospitais.
A cesariana planejada ou a de emergência são admitidas em poucas circunstâncias: quando o parto anterior foi uma cesárea; se o bebê está sentado; se a gestante tem placenta prévia (quando ela está fixada à parede do útero, cobrindo parcial ou totalmente o cérvice uterino); ou quando há um deslocamento prematuro da placenta.
De acordo com o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG), a associação de obstetrícia e ginecologia da Grã-Bretanha, a probabilidade de uma cesariana está fortemente associada às características maternas e fatores clínicos de risco.

Cesariana planejada

Segundo o Royal College of Midwives, que representa as parteiras britânicas, mesmo depois da mudança das regras, as mulheres não são encorajadas a optar pela cirurgia, mesmo nas situações mais complexas.
No caso do bebê sentado, a mãe pode optar por tentar reposicioná-lo através de pressão externa, em vez de recorrer imediatamente à cesárea.
De acordo com o NHS, cerca de 50% dos bebês que não estão com a cabeça para baixo conseguem ser virados usando uma manobra conhecida como versão cefálica externa.
Em outro caso comumente associado às cesarianas – quando o bebê tem o cordão umbilical enrolado em torno do pescoço – a cirurgia sequer é cogitada. A parteira se encarrega de desenrolá-lo durante o parto.
Para Cathy Warwick, chefe executiva do Royal College of Midwives, é tudo uma questão de confiança.
"Se as parteiras conseguirem fazer com que as mulheres entendam o que suas escolhas significam para elas e para seus bebês, elas se sentirão apoiadas na hora do parto”, afirma Warwick. “Então, poucas mulheres farão a escolha por uma cesariana."
Fonte Alexandra Nunes
Atualizado em  14 de abril, 2014 - 12:59 (Brasília) 15:59 GMT

Normal ou cesárea? Conheça riscos, mitos e benefícios de cada tipo de parto


A cesariana é um recurso importante para salvar vidas, mas não deve ser feita desnecessariamente
Cientistas de 25 países resolveram estudar o impacto da realização de cesarianas em grávidas de gêmeos. O esforço internacional foi motivado pelo aumento do número de cirurgias agendadas nestes casos em todo o mundo devido à crença de que há um risco maior para a mãe e os bebês quando o nascimento ocorre por parto normal. Só nos Estados Unidos, o índice saltou 50% entre 1995 e 2008, para 75% dos partos de gêmeos.
O estudo analisou 2,8 mil partos ao longo de oito anos e seu resultado - publicado no fim do ano passado - vai contra o imaginário coletivo. "A cesárea planejada não reduz o risco de morte em gravidez de gêmeos", diz o obstetra Renato Sá, vice-presidente da Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro (Segorj), que participou da pesquisa. "Provou-se que era mito."
Não se trata do único falso motivo apontado como indicação de cesárea em consultórios Brasil afora. Obstetras ouvidos pela BBC Brasil relatam casos em que mulheres fizeram cesáreas desnecessárias porque "o bebê é grande ou pequeno demais", "a mãe tem bacia estreita" ou "o bebê virou de posição durante o parto".
Uma dos mitos mais frequentes na indicação de cesariana é o bebê estar com o cordão umbilical enrolado no pescoço. "O cordão é como um fio de telefone: para enforcar a criança, seria necessário muito esforço", diz Sá. "De qualquer forma, quando ela desce pelo canal vaginal, o cordão vai se desenrolando."
Na verdade, são poucas as situações que podem ser solucionadas apenas pela cesariana, segundo os médicos consultados para esta reportagem. Uma delas é quando a placenta se desloca e bloqueia a saída do bebê, fenômeno conhecido como placenta prévia total. A força feita pela criança ao tentar nascer pode causar uma hemorragia grave e o óbito da mãe e do filho.
Outro caso é a hipertensão desenvolvida pela mulher durante gestação, a eclampsia. "Se a mãe é diabética grave, também é preciso fazer cesárea", afirma Etevino Trindade, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Quando a gestante tem um problema de coração grave, a cirurgia deve ser feita.
Ainda estão nessa categoria grávidas portadoras do vírus HIV que tenham uma carga viral alta e imunidade baixa ou com uma lesão de herpes genital ativa no fim da gestação (a cesárea evita o contágio do bebê) e o descolamento prematuro da placenta, que gera risco de sangramento excessivo.
Na maioria dos casos, a situação específica deve ser avaliada. "Uma cesárea também traz riscos, apesar de serem menores do que no passado", diz o obstetra Pedro Octávio Britto Pereira, professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). "É preciso saber qual é a forma de parto mais segura e optar por ela."

Riscos

Não se pode negar que a cesariana é um recurso valioso para salvar vidas e deve ser usada num quadro crítico. Pode ser o caso, por exemplo, de quando o cordão umbilical sai antes do bebê, durante o parto, fenômeno conhecido como prolapso. Isso corta o fluxo de sangue para a criança. A situação deve ser resolvida em minutos, caso contrário o bebê morre.
No entanto, a cesárea é em geral mais arriscada e pode trazer prejuízos para a mãe e o bebê. O estudo "Morte materna no século 21", publicado em 2008 no periódico American Journal of Obstetrics and Ginecology, analisou 1,46 milhão de partos e encontrou um risco de óbito dez vezes maior para a gestante em cesarianas. Enquanto a taxa de morte em partos normais foi de 0,2 para 100 mil, no caso das cesáreas chegou a 2,2 por 100 mil.
Deve-se levar em conta que, em parte dessas cesáreas, a situação já era emergencial e mais arriscada. Mas o aumento do agendamento deste tipo de parto torna o índice preocupante. A cesárea é uma cirurgia e pode gerar hemorragia, infecções e danos a órgãos internos da gestante, sem que fosse necessário assumir o risco de ter estas complicações.
Recém-nascido (PA)
Em geral, o parto normal é menos arriscado e traz benefícios para a mãe e o bebê
O maior número de cesáreas agendadas também coincide com o aumento de bebês prematuros, já que a idade gestacional não pode ser calculada com exatidão. Isso faz com que nascimentos ocorram muito antes do recomendado, algo associado a problemas respiratórios no bebê.
O parto normal traz benefícios para o bebê e a mãe. Durante o parto, a mãe produz os hormônios oxitocina, que estudos indicam ser capaz de proteger o recém-nascido de danos no cérebro e ajudar no amadurecimento cerebral, e prolactina, que favorece a amamentação. "O parto normal é um processo fisiológico normal. Não há por que transformar isso num procedimento cirúrgico sem necessidade", afirma Sá, do Segorj.
Uma situação em que a cesárea costuma ser pré-agendada no Brasil é quando o bebê está "sentado" na barriga da mãe. Isso gera o risco da sua cabeça ficar presa na pélvis da mãe. Mas a cesárea não é a única saída. O médico pode tentar, durante a gestação, colocar manualmente o bebê de ponta cabeça, posição mais indicada para o nascimento, por meio de uma manobra conhecida como versão externa.
Ter feito duas cesáreas anteriormente também não é indicação absoluta de necessidade de nova cesárea. Como o útero tem cicatrizes de operações anteriores, elas podem se romper durante o parto normal. "Mas a literatura médica indica que a mulher tem o direito de tentar porque o risco absoluto é baixo, de menos de 1%", afirma o obstetra Jorge Kuhn. "Se os pais acharem que ainda assim é um risco alto, é melhor nem tentar."

Informação

Os obstetras ouvidos pela BBC Brasil são unânimes numa questão: a melhor forma da mãe tomar uma decisão é informar-se. É possível consultar os sites da Febrasgo e da Associação Médica Brasileira, órgãos que publicam diretrizes sobre partos normais e cesarianas. Os colégios de ginecologia e obstetrícia dos Estados Unidos, da Austrália, do Canadá e do Reino Unido servem de referência para profissionais de todo o mundo.
"Se a mulher não vai atrás de informação, ela dá ouvidos aos relatos de amigas e parentes. Muitas dessas mulheres fizeram cesáreas por razões que consideram justificáveis, mas que não são", afirma Kuhn. "A mãe também pensa que o médico estudou muito para se formar e que não tem autoridade para questioná-lo. Mas é importante que ela saiba as indicações reais e seus direitos para ser a protagonista de seu parto, em vez de delegar isso ao obstetra."
Caso a mulher opte pelo parto normal, é indicado que ela descreva num documento o plano de parto, como gostaria de ser tratada antes, durante e depois, deixando suas preferências claras para a equipe médica. São importantes dados como quem será o acompanhante, as intervenções médicas bem-vindas ou não e se quer dar de mamar logo depois do bebê nascer.
Assim, a mulher pode debater com o médico para que tudo fique esclarecido. O plano de parto não tem validade legal, como um contrato, mas aumenta as chances da mãe ter seu filho da forma como deseja. "Não quer dizer que isso será obedecido, mas garante um questionamento jurídico se houver necessidade", explica a obstetriz Ana Cristina Duarte, uma das principais vozes do movimento de humanização do parto no país.
Se a mãe não tiver sua vontade respeitada ou sofrer algum tipo de violência no parto, ela deve exigir uma cópia de seu prontuário no hospital e denunciar o caso. É aconselhado escrever uma carta com os detalhes do ocorrido. "Envie para a ouvidoria do hospital com cópia para a diretoria clínica, para a Secretaria Municipal de Saúde e para a Secretaria Estadual de Saúde", diz Duarte.
A obstetriz acrescenta que, se o parto ocorreu em uma maternidade particular, a diretoria do plano de saúde e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) também devem ser comunicadas. "Se for um caso grave, procure a ajuda de um advogado", afirma Duarte.

Fonte Mariana Della Barba e Rafael Barifouse
Atualizado em  14 de abril, 2014 - 05:43 (Brasília) 08:43 GMT

'Desvalorização' de parto normal torna Brasil líder mundial de cesáreas


Cesárea (BBC)
Com 52% dos partos feitos por cesarianas - enquanto o índice recomendado pela OMS é de 15% -, o Brasil é o país recordista desse tipo de parto no mundo
Quando a fotógrafa Daniela Toviansky, de 35 anos, ficou grávida, passou a frequentar aulas de hidroginástica com outras gestantes em estágios próximos de gravidez. Ela lembra que, entre uma aula e outra, todas manifestavam um desejo em comum: ter filhos por parto normal. "Todas acabaram fazendo cesárea", conta Daniela, que se tornou a exceção. Seu bebê, Sebastião, nasceu após 40 semanas de gestação e da forma como ela queria.
O que aconteceu com as colegas da fotógrafa é uma amostra fiel da situação vivida por muitas grávidas no Brasil hoje, especialmente entre as classes mais altas, em um processo que muitos especialistas vêm chamando de "a indústria da cesárea brasileira".
Com 52% dos partos feitos por cesarianas - enquanto o índice recomendado pela OMS é de 15% -, o Brasil é o país recordista desse tipo de parto no mundo. Na rede privada, o índice sobe para 83%, chegando a mais de 90% em algumas maternidades. A intervenção deixou de ser um recurso para salvar vidas e passou, na prática, a ser regra.
Um caso extremo chamou a atenção há três semanas, quando a gaúcha Adelir Lemos de Goes, uma mãe de 29 anos de Torres (RS), foi obrigada por liminar da Justiça a ter seu bebê por cesárea. Ela foi levada à força ao hospital quando já estava em trabalho de parto, provocando debates acalorados sobre até onde a mãe o poder de decisão sobre o próprio parto.
O caso também levou centenas de pessoas a saírem às ruas, em cidades do Brasil e do exterior, para protestar na última sexta-feira. A manifestação foi batizada de "Somos Todas Adelir - Meu Corpo, Minhas Regras."
Mas por que e desde quando o Brasil começou a mergulhar nesta verdadeira epidemia de cesáreas? Falhas profundas na regulamentação do sistema de saúde do país e uma lógica perversa na gestão de profissionais e obstetras que, por questões financeiras, acabaram perdendo o hábito de fazer partos normais são algumas das causas, agravadas principalmente pela falta de informação que cerca o assunto.

Desinformação

Uma pesquisa feita pela Fiocruz ("Trajetória das mulheres na definição pelo parto cesáreo") acompanhou 437 mães que deram à luz no Rio, na saúde suplementar. No início do pré-natal, 70% delas não tinham a cesárea como preferência. Mas 90% acabaram tendo seus filhos e filhas assim — em 92% dos casos, a cirurgia foi realizada antes de a mulher entrar em trabalho de parto.
O levantamento dá a medida de que, em algum estágio dos nove meses de gestação, algo fez a mulher mudar de ideia. As pesquisas da Fiocruz mostram a "baixa informação recebida pelas mulheres em relação às vantagens e desvantagens dos diferentes tipos de parto e a baixa participação do médico como fonte desta informação".
O estudo e os profissionais de saúde ouvidos pela BBC apontam que as grávidas, de todas as classes sociais, estão longe de estarem bem informadas.
Poucas mães e futuras mães sabem, por exemplo, que as cesáreas aumentam o risco de um bebê nascer prematuro (com menos de 37 semanas de gestação). Isso porque muitos partos são marcados para essa idade gestacional e, como há possibilidade de erro de até uma semana, o bebê pode ser ainda mais novo. A esmagadora maioria destas intervenções não é feita de forma emergencial, mas, sim, programada.
Além de ser a causa de mais da metade das mortes de crianças no país, a prematuridade pode trazer uma série de riscos para o bebê, especialmente doenças respiratórias e dificuldade de mamar. Eles também deixam de se beneficiar do contato com hormônios que são liberados apenas em certos estágios do trabalho de parto.
No Brasil, 15 milhões de bebês nascidos em 2010 eram prematuros, o equivalente a 11,7%, segundo uma pesquisa conjunta feita pelo governo e o Unicef. O índice, que coloca o Brasil na décima posição entre os países com maior prematuridade, é mais alto nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste - justamente as que têm mais cesarianas, o que pode indicar uma relação entre os dois fatores.
Além disso, a falta de informação no pré-natal faz com que não haja espaço para esclarecimentos de como a mulher pode lidar com a dor ou outros aspectos, como o que exatamente vai acontecer no parto e como se preparar.
"Muitas vezes , o médico não explica questões sexuais para a grávida, por exemplo", conta Etelvino Trindade, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). "Então elas vão se informar com a vizinha, a avó, a prima... e elas sempre têm uma história sobre o parto normal, seja ela escabrosa ou apenas mentirosa. É bastante arraigada a noção de que o parto normal vai deixar a mulher 'larga' e, assim, sexualmente inadequada. A cesárea é uma alternativa à esse medo. Mas isso acontece porque há um tabu em se falar sobre esses temas e porque hoje o médico é muito técnico. É um curador, não um cuidador."

Falhas no sistema de saúde e a questão financeira

Segundo especialistas ouvidos pela BBC Brasil, a "indústria da cesárea" começou a se formar há 40 anos. "A epidemia de cesarianas começa na década de 70, quando ela começou a ser vendida como solução (de cirurgia única) para a esterilização definitiva, a laqueadura das trompas", explica a obstetriz Ana Cristina Duarte, uma das principais vozes do movimento de humanização do parto no país.
O ginecologista Etelvino Trindade, presidente da Febrasgo, acrescenta outro fator ocorrido naquela época, decorrente da criação de instâncias do INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), que passaram a determinar que um médico só receberia se participasse efetivamente do parto.
"Até então, o bebê nascia com a obstetriz e o obstetra supervisionava, entrava se houvesse alguma intercorrência, como acontece em países europeus até hoje", diz Trindade. "Mas as regras mudaram e ele passou a precisar estar sempre na sala de parto (para receber). Assim, o quadro começou a mudar."
Daniela Toviansky com seu filho, Sebastião (BBC)
Daniela Toviansky mudou de obstetra por achar que ele a induziria à cesárea
Já na década de 80, segundo Ana Cristina, acontece a dicotomização das taxas de cesárea diferenciadas no setor público e privado. "É nessa década que as taxas do setor público aumentam um pouco, porém as do setor privado saltam para níveis alarmantes. Nas décadas seguintes, cada vez mais brasileiros têm aderido ao setor privado, fazendo as taxas globais brasileiras chegarem aos níveis atuais."
Braulio Zorzella, ginecologista defensor do parto normal e pesquisador da área, diz que "a grande vilã, o carro-chefe dos culpados, é a ANS". A Agência Nacional de Saúde é a reguladora dos planos de saúde do Brasil.
Segundo ele, quando a agência hierarquizou os procedimentos, acabou chancelando uma tabela já em vigor que remunerava de maneira discutível o parto - regras mantidas até hoje.
"Todos os valores foram sendo achatados e, em um determinado momento, não valia mais a pena para um médico fazer parto normal, financeiramente falando."
Apesar de na rede pública o obstetra ganhar um pouco a mais pela cesárea e, na privada, um pouco a mais pelo parto normal, a diferença de valores é mínima. Ou seja, um profissional recebe quase a mesma coisa para fazer uma cesárea, que dura cerca de 3 horas, e um parto normal, que pode muito bem passar das 12 horas.
"Se você paga R$600 por um parto [na rede privada], o médico prefere fazer uma cesárea e ganhar quase o mesmo do que passar a noite trabalhando", diz Renato Sá, ginecologista e obstetra, Vice-Presidente da Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro (Sgorj).
Para Ana Cristina, o cenário faz com que a cesariana marcada com antecedência seja mais vantajosa, por conta da imprevisibilidade do parto normal. "[Com a cesárea marcada], não só o médico não perde tempo, como ele também não precisa desmarcar compromissos, consultas no consultórios, viagens, etc".
Questionada duas vezes pela BBC sobre as pequenas diferenças pagas aos médicos em partos normais e cesarianas, a ANS respondeu que "recentemente, ocorreram diversos avanços na política do setor no que diz respeito a esse tema, como, por exemplo, a criação do Comitê de Incentivo às Boas Práticas entre Operadoras e Prestadores."

Desvalorização profissional

As mudanças do sistema de saúde nos anos 70 e 80 contribuíram também com a desvalorização de outros profissionais ligados ao parto.
Para Trindade, presidente da Febrasgo, as mudanças no INPS incentivaram a presença constante dos ginecologistas durante o parto e acabaram desvalorizando profissionais como as parteiras, obstetrizes e enfermeiras especializadas.
Em muitos hospitais, hoje, não há uma equipe obstétrica completa e treinada para auxiliar o parto normal.
"A estrutura humana dos hospitais, em geral, é bem ruim", diz Braulio Zorzella. "Não há uma equipe transdisciplinar, com enfermeira obstetra, obstetriz, doula e anestesistas trabalhando juntos. Essa seria a formação ideal para ajudar a mulher durante o trabalho de parto."
Segundo ele, outro agravante é que, em hospitais ligados a convênios, não há profissionais especializados de plantão 24 horas por dia. O principal problema apontado por médicos ouvidos pela reportagem é a falta de anestesistas, que muitas vezes trabalham em esquema de sobreaviso - não ficam na instituição, são chamados somente em caso de urgência.
Muitas vezes, demandas de anestesia em partos não são consideradas fortes suficiente para chamar o médico em casa, criando um cenário com duas principais consequências.
A primeira, recorrente na rede privada: com o risco de chegar em um hospital e não encontrar um anestesista, mulheres e médicos preferem marcar a cesárea com antecedência.
"E a ANS permite que planos tenham hospitais conveniados sem essas equipes obstétricas de plantão, alimentando a indústria", diz Zorzella.
Já a segunda consequência é característica da rede pública: quando a mulher que precisa e quer anestesia não a recebe.
Para Zorzella, "parte dos partos, especialmente os induzidos com ocitocina, viram uma tortura se não houver anestesia."
A dor aguda, sem nada para amenizá-la, faz com que muitas mulheres passem por experiências traumáticas no parto normal, ampliando a crença de que este é um método com dores insuportáveis e que, por isso, a cesárea seria uma melhor opção.
De acordo com o Ministério da Saúde, em uma cesariana feita pelo SUS a mulher tem direito a contar com o anestesista de plantão.
"No caso do parto normal, o Ministério recomenda que, antes de ofertar uma analgesia de parto, o hospital deve ofertar os métodos não farmacológicos de alívio da dor, que oferecem menos riscos e podem resolver o problema da sensibilidade a dor sem os riscos da analgesia. Esses métodos incluem apoio contínuo, liberdade de movimentação e adoção de posições, acesso a água - como chuveiro e banheira – acesso a escada de ling, ao cavalinho e banquinho, que são instrumentos de fisioterapia para adotar outras posições para o parto normal, além do apoio pela doula, a ambiência da maternidade e a privacidade", afirmou o órgão em nota enviada à BBC.
O Ministério da Saúde também informou que não recomenda o uso de ocitocina para aceleração do parto e lembrou que o governo vem tentando combater o número crescente de cesáreas, com iniciativas como a criação da Rede Cegonha e das chamadas Casas de Parto, que têm como metas incentivar o parto normal humanizado.

A falta de leito e os interesses dos hospitais privados

"Perdemos 20 mil leitos hospitalares em ginecologia e obstetrícia", afirma Trindade, da Febrasgo. "Sem a garantia de que terá uma vaga em um hospital quanto entrar em trabalho de parto, muitas mulheres e médicos preferem não correr esse risco", diz o ginecologista, em referência a um problema similar ao da falta de anestesistas.
Pedro Octávio de Britto Pereira, obstetra e professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) concorda que há cada vez menos maternidades e vagas para parto. "E uma forma de garantir uma vaga em um bom hospital é marcar e fazer cesárea."
Protesto contra cesárea forçada (Zilda Pavão)
Mulheres protestaram contra decisão da Justiça de forçar uma dona de casa a fazer cesárea
Se, por um lado, para o plano de saúde é bom que haja centro obstétrico (para poder colocar mais maternidades conveniadas em sua listagem), para os hospitais não é interessante financeiramente. "Usar o espaço físico para colocar aparelhos sofisticados, como um tomógrafo, rende muito mais para o hospital", afirma Trindade. Pereira concorda: "O parto privado não dá lucro aos hospitais. Os hospitais preferem procedimentos mais complexos."
Segundo o médico Francisco Balestrin, presidente do conselho de administração da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), não houve queda significante nos leitos de hospitais privados da associação, pois em sua maioria são hospitais gerais, ou seja, de diversas especialidades.

A formação do médico e o médico como formador de opinião

A crença de que cesárea é opção válida não apenas para casos de emergência é, não raramente, reforçada em faculdades. "Como são feitos cada vez menos partos normais, há menos chances de treinar os novos médicos, que não se sentem habilitados a fazer esse tipo de parto por não dominar todas as técnicas necessárias para isso. Junta a fome com a vontade de comer", avalia o ginecologista Renato Sá.
Outro fator (que faz o médico optar pela cesárea) é a judicialização da medicina. "O médico é responsável por qualquer coisa que acontece, então, quando chega numa situação de risco, ele opta pela cesárea porque se houver uma fatalidade ou complicação será questionado por que não fez isso. Isso gera um medo nos médicos em tentar o parto normal", explica Sá.
Com todo o quadro encontrado pelos ginecologistas - com má remuneração, equipe auxiliar falha, faculdades que preparam pouco e judicialização - muitos médicos acabaram se convencendo de que uma cesariana é a melhor opção para muitas mulheres.
"E no Brasil, a palavra do médico é sempre a que vale mais. Mais do que a da grávida em si, por exemplo. E assim médicos influenciam - e muito - a opinião pública, colaborando para a epidemia de cesárea", diz Zorzella.
A opinião é reforçada pelo estudo da Fiocruz, que apontou o peso da opinião médica e a falta de interesse desse profissional pelo parto normal como motivos da desinformação das mães e pais sobre o tema.
"É importante ressaltar que esse processo de tomada de decisão pelo tipo de parto se dá numa relação de poder que se estabelece no diálogo entre o médico e a mulher, e que muitas vezes inibe qualquer questionamento da decisão do profissional", afirmam os pesquisadores da Fiocruz. "A mudança do tipo de parto, em relação à preferência anterior, parece moldada pela conduta intervencionista do médico."
Casos como o de Adelir, em Torres, e o crescimento, ainda que tímido, de movimentos pelo parto humanizado e centrado na mãe (não no médico) fazem com que os especialistas da área debatam e busquem maneiras para trazer o índice de cesáreas para baixo.
Zorzella acredita ser necessário que a ANS estabeleça metas para que seja reduzido em 5% ao ano o número de cesáreas na rede privada. Outros dizem que é preciso trabalhar com os estudantes de medicina para se voltar a incentivar o parto normal, analisando dados e métodos de países (em regra, ultradesenvolvidos) onde há muito menos cesáreas - na Holanda, por exemplo, o índice gira em torno de 10%.
A opinião geral passa sempre por uma profunda revisão no sistema para ajudar a mulher a se informar melhor sobre o parto e buscar a melhor decisão. "O fornecimento de informações às mulheres, antes e durante a gestação, deve ser um caminho a ser trilhado na tentativa de reverter este quadro (de cesáreas em excesso)", afirma o estudo da Fiocruz.

Fonte 

Mariana Della Barba e Rafael Barifouse

Atualizado em  14 de abril, 2014 - 05:44 (Brasília) 08:44 GMT